terça-feira, julho 28, 2009

TOPOGRAFIAS DO CORPO











Evento no SESC avenida paulista dia 15 de junho dentro da programação do VIII Congresso de Transtornos Alimentares e Obesidade, realizado de 11-13 de Junho em São Paulo e promovido pelo Programa de Orientação e Assistência a Pacientes com Transtornos Alimentares - PROATA-UNIFESP.
O evento contou com convidados de diversas áreas, que debateram sobre o tema sob os mais variados olhares, na tentativa de abranger o corpo em seus aspectos biológico, antropológico e artístico.
A primeira atividade do evento contou com Claudio Feijó, fotógrafo e psicoterapeuta, que, por meio de suas fotografias, propôs a percepção da linguagem não-verbal, ou seja, no entendimento da figura e do conteúdo por trás da mesma.
Em seguida, o tema “Para não tirar o corpo fora” foi muito bem discutido entre os participantes da mesa de debates. Mediados por Luiz Alberto hetem da Associação Brasileira de psiquiatria, o psiquiatra e psicanalista Armando Barriguete Meléndez do México, o psicanalista Mario Pablo Kucks do Sedes Sapientiae, a nutricionista Regina Amadeu da Costa do PROATA, a também nutricionista Marle Alvarenga do Grupo de Estudos em Nutrição e Transtornos Alimentares – GENTA, e a pesquisadora de moda Cristiane Mesquita do evento “Zigue-zague” discorreram suas opiniões sobre a frase tema e responderam perguntas e dúvidas que suscitaram na platéia ao decorrer da atividade.
Nos dias de hoje, é impossível “tirar o corpo fora” de uma sociedade em que o impacto cultural no corpo o tornou alvo de uma neurose coletiva. Deste modo, observa-se uma dualidade nas relações (individual e coletiva) estabelecidas do indivíduo com os corpos. O amor e o ódio emergentes na composição da aparência e do corpo revelam a colocação paradoxal do mesmo, que atualmente se encontra tão fortalecido como fragmentado, tão exposto quanto blindado e tão visível quanto esquecido.
A tendência cultural define como deve ser o corpo, deste modo agindo como “facilitador” de um corpo tão ideal quanto inatingível, o levando a existir como um corpo plástico, um corpo “objetificado”.
O corpo está ainda onipresente nos problemas patológicos da contemporaneidade. Segundo Freud, o corpo permitia a emersão de sintomas resultantes de conflitos internos, atuando como defesa a questões não verbalizadas. Observa-se atualmente o corpo agindo como defesa para questões tanto internas como externas. Estas últimas são reflexo da contemporaneidade e podem ser exemplificadas por incertezas relacionadas ao trabalho, ao meio ambiente e à família. Assim sendo, o investimento excessivo no corpo atua de modo a esconder a fragilidade do indivíduo contemporâneo e suas angústias.
O corpo também é poder, ou assim lhe é atribuído. Na verdade, o corpo só é poder quando “controlado”. Neste caso podemos observar as modelos, referências de beleza, que controlam seus corpos e os mantém dentro de padrões estabelecidos. Quando isto ocorre, é ignorada a subjetividade do ser humano, resultando em um corpo “decorativo”. Ainda que supostamente controlado, o corpo ajustado aos moldes sociais é, na verdade, privado de seu poder, de sua liberdade e de sua vivência.
Alguns focos deste debate foram:
· Há uma relação de amor X ódio na composição da aparência e corpo, derivando em uma colocação paradoxal do corpo.
· O corpo é tão fortalecido quanto fragilizado, exposto quanto blindado e visível quanto esquecido.
· O impacto sociocultural no corpo causa uma neurose coletiva em relação ao mesmo.
· As reflexões e estudos de cada um sobre o corpo vão permear sua vivência corporal.
· A cultura age como “facilitador” de um corpo ideal, um corpo plástico.
· A renúncia de entender o corpo leva à existência de um corpo objeto.
· A cultura contemporânea leva à onipresença de um corpo “sobreinvestido”.
· Segundo Freud, a histeria era a manifestação de sintomas de conflitos que, na impossibilidade de serem verbalizados, se expressavam por meio do corpo.
· Hoje o corpo atua como defesa tanto de questões internas (como disse Freud) como externas – cultura.
· Ameaça ao suporte narcísico da própria identidade que leva ao investimento excessivo do corpo (tira o corpo das ameaças e vivências de fragilidade).
· O corpo adquiriu novas funções como o poder, transformando-se em uma nova forma de capital.
· O corpo dos dias de hoje só possui poder caso este seja controlado.
· Modelos: controlam o corpo dentro de um padrão.
· A importância do controle do corpo se dá ao mesmo tempo em que houve a perda do controle de outros aspectos na sociedade (família, ambiente).
· O corpo é o emissor de nossa subjetividade.
· Estatização do biológico (Foucault) X Estetização do biológico

Por fim, a antropóloga Moara Passoni apresentou fragmentos de seu filme “Tem um vidro sob minha pele”, ainda em processo de edição. O filme, a respeito do corpo anoréxico a partir da experiência da própria anoréxica, intenta transmitir a poética de tal corpo, com todos os elementos que permeiam a condição. Foram utilizados diários de pessoas com transtorno alimentar para o roteiro.
A idéia foi dar voz do corpo anoréxico, mas na verdade apresentando o corpo como o grande centro ausente do filme - no filme não aparecem corpos e sim imagens que evoquem a memória do corpo, rastros e espaços por onde o corpo anoréxico da diretora viveu. Por meio de núcleos de filmagem e fragmentos acabados é passada a imagem de constelação do corpo anoréxico.

Uma reportagem de Priscila de Moraes Sato e Marle Alvarenga – nutricionistas do Genta
www.genta.com.br
Matéria publicada previamente no site http://www.projetosterapeuticos.com.br

segunda-feira, julho 20, 2009

Carta à revista Veja - considerações a respeito da reportagem "A prova que faltava" (15-07-09)

À equipe de redação da revista Veja
Gostaria de fazer algumas breves considerações a respeito da reportagem “A prova que faltava”, publicada na edição de 15 de julho de 2009. Em primeiro lugar, senti falta no texto da participação de um nutricionista, que de fato é o profissional capacitado e qualificado para estudar e avaliar a relação entre o homem e o alimento. Em segundo lugar, como a revista por si só coloca, não existem estudos controlados a longo prazo com seres humanos que suportem as evidências encontradas nos estudos com animais que foram citados. Seria muito difícil – para não dizer inviável – manter uma dieta bastante restritiva qualitativamente e quantitativamente, como a proposta pelos cientistas na reportagem. Os animais dos estudos não optaram conscientemente por fazer restrição e, portanto, não tiveram que passar pelo estresse psicológico de se controlarem tendo muita comida à disposição, ao contrário das pessoas que fazem dieta. Além disso, são vários os trabalhos científicos que demonstram a ligação inegável entre a prática de dietas e o surgimento de cravings – desejos fortes de consumir algum alimento, principalmente aqueles ricos em açúcar e gordura – e compulsões alimentares, e já se sabe que na etiologia complexa dos transtornos alimentares, fazer dieta é o principal fator precipitante. Finalmente, há de se considerar que a longevidade humana é influenciada por inúmeros fatores, que incluem o bem-estar físico e psicológico. De que vale viver por muitos anos uma vida muito chata? Como bem disse Woody Allen: “Você pode viver 100 anos se desistir de todas as coisas que o fazem querer viver até os 100 anos”.


Atenciosamente,
Ana Carolina Pereira Costa
Estudante de Nutrição e estagiária do AMBULIM – Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Hospital das Clínicas de São Paulo

FINALMENTE INICIA-SE A BATALHA POR UM CORPO SAUDÁVEL !

Um artigo publicado no dia 13 de junho, pela revista britânica The Times, discute a batalha que a editora da Vogue britânica Alexandra Shullman vêm travando contra o “tamanho zero” (“size-zero”). Antes de apresentar o artigo, vale a pena definir aos leitores o que significa esse termo, ou seja, a tendência ao “size-zero” tão em evidência no meio da moda.
Não existe uma tradução correta, mas sim o conceito de garota “size-zero”. Apesar de este termo indicar um tamanho de roupa, que aqui no Brasil equivaleria ao tamanho 32, no mundo da moda ele é usado como uma expressão desta nova tendência de meninas ou mulheres extremamente magras.
O termo começou a ser popularizado, quando organizadores da semana de moda de Madrid utilizaram como critério para participação dos desfiles o índice de massa corporal (IMC), e não as medidas corporais, iniciando um movimento contrário ao “sizer-zero”. A exigência, infelizmente, surgiu somente após o meio da moda enfrentar a morte de três modelos anoréxicas:
Luisel Ramos, Ana Carolina Reston e Eliana Ramos, que tinham IMC menor que 16. Apesar dos riscos, celebridades como Victoria Beckham, Nicole Richie e a atriz indiana Kareena Kapoor ainda adotam e glamourizam a figura de “size-zero”.
O assunto tem gerado muita discussão no meio da moda, e atualmente a iniciativa, ou podemos dizer que a briga que a editora da Vogue vêm travando contra os estilistas de moda, parece ser um início da batalha por um corpo saudável. A editora Alexandra Shulman, considerada uma das figuras mais importantes da indústria multimilionária da moda, mandou uma carta de protesto contra esta atitude aos grandes estilistas, na qual os acusa de incentivar, e de maneira indireta até obrigar, a apresentação de modelos “size-zero” nas revistas de moda. O jornal The Times teve acesso a esta carta, e cita alguns trechos dela em que Shulman diz que como os estilistas só enviam à revista peças minúsculas de roupas para saírem nos editoriais de moda, a revista acaba sendo “obrigada” a trabalhar com modelos “size-zero”, ou nas palavras da editora, “modelos com ossos salientes, sem seios ou quadris”. Ela diz que atualmente a Vogue têm feito com freqüência “retoques” nas fotografias para que as modelos pareçam maiores.
Shulman alega que as roupas criadas pelos estilistas e enviadas para as revistas para serem utilizadas em seus editorais se tornaram “substancialmente pequenas”, e que “agora atingimos o ponto em que muitas das roupas não servem mais em modelos famosas”. Ela relata que as peças de roupas são enviadas às revistas seis meses antes delas aparecerem nas lojas e que os editores não têm escolha a não ser contratar modelos que sirvam nas roupas, pois se não o fizerem, correm o risco de mostrarem as peças mais atuais, das últimas coleções das grandes grifes.
A posição de Alexandra significa um grande avanço, na opinião de modelos, como Erin O’Connor, e especialistas, como Baroness Kingsmill, que coordenou uma pesquisa com apoio do Conselho Britânico sobre a saúde das modelos em 2007. A enorme influência que a editora têm no mundo da moda, pode significar uma abertura para a discussão sobre os padrões de beleza atuais, ajudando desta forma a trabalhar a percepção que as pessoas têm de um corpo saudável, e consequentemente levar a uma melhor aceitação de si mesmas. Sendo assim, a imagem de beleza de meninas ou mulheres “size-zero” mostrada numa revista, que escondem o sofrimento dos transtornos alimentares pode ter seus dias contados, se todos editores de moda forem a favor da causa de Alexandra. Esperamos que isso aconteça, para que finalmente possamos ver uma luz no fim do túnel.
Para acessar a reportagem na íntegra, com comentários dos leitores clique no link abaixo: